Fascismo à Brasileira Uma patologia psicosocial ameaça a nação

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Antonio P. Pacheco*

A sociedade brasileira está profundamente doente em sua psiquê coletiva. O resultado do pleito eleitoral, o modus como transcorreu a campanha do candidato eleito, a reação em crescendo de alucinado frenesi persecutório e destrutivo que acomete seus apoiadores, a passividade deleituosa de um grupo grande de pessoas bem formadas e com acesso facilitado à informações qualificadas diante da escalada de violência, ameaças à integridade física de minorias, contra as liberdades cidadãs, contra a democracia. Tudo isso compõe um cenário tétrico e se constitui em sintomas de uma patologia social do tipo “metástase” que avança na consciência coletiva identificada por Émile Durkhein e necrosa o tecido da unidade nacional, comprometendo de forma avassaladora a paz e o futuro imediato do país ao mergulhar a nação no estado de anomia em que se encontra. 

O que assistimos até aqui no campo político eleitoral e social, no entanto, ainda que seja por si só estarrecedor em todos os seus aspectos, não é nem o princípio do pior que poderá vir a se tornar rotina no dia a dia dos brasileiros. Sem alarmismo ou exageros histriônicos: o fundo do poço ainda está longe de ser alcançado.

É preocupante – e apavorante – ver acontecer esta metamorfose que transforma seres humanos simpáticos e inteligentes em animais ferozes.

A queda livre em que o país se acha se retroalimenta com a adrenalina a cegueira da grande massa, viciada no prazer de correr novos riscos, no perigo da desagregação social, nas descobertas alucionógenas do proibido, do interditado, do desprezível, do politicamente incorreto, da violência como solução imediata para suas frustrações e impossibilidades. 

Todas as barreiras de contenção da animalidade, da selvageria atávica que a civilização e a cultura ocidental estabeleceu ao longo dos últimos dois mil anos estão sendo rapidamente destruídas. Como explicar de outra forma esse fenômeno de iminente suicídio cívico coletivo? Não há nada que faça essa manada desenfreada perceber que a queda, em seu final, poderá ser fatal, literalmente, para todos.

 Tenho observado, e me sentido desconcertado, com a facilidade com que as pessoas abandonam a racionalidade para desumanizar o outro quando confrontadas com as suas próprias atitudes e opiniões em relação àqueles que não têm a sua cor de pele, seu padrão de comportamento, não professa os seus credos, não comunga de seus gostos de consumo, não frequenta os seus ambientes de convívio, lazer e socialização. 

É preocupante – e apavorante – ver acontecer esta metamorfose que transforma seres humanos simpáticos e inteligentes em animais ferozes, capazes de fazer piada e pouco caso com a morte pela polícia de um pai de família, trabalhador e honesto, confundido com um traficante porque portava um guarda-chuva, que é capaz de naturalizar atos como os de alunos apontarem armas para as costas de um professor em sala de aula, considerar positivo a instituição de censura prévia em escolas públicas e universidades, se armar e matar, que diz que ditadura e militarismo é melhor que democracia e liberdade.

 

este mal veio dos laboratórios que fabricam realidades virtuais para a massa popular por encomenda daquela parcela da sociedade que detém o poder do dinheiro

Onde é o nascedouro desta degeneração da psiquê coletiva brasileira? Em que momento da nossa história recente se espalhou o virús dessa patologia – que por analogia e similaridade de sintomas chamamos generica e imperfeitamente de fascismo à brasileira – e que se expressa na forma de um ódio irracional e primitivo contra qualquer um que não emita o mesmo odor pútrido do sectarismo político ultra e neoliberal? A resposta é óbvia: este mal veio dos laboratórios que fabricam realidades virtuais para a massa popular por encomenda daquela parcela da sociedade que detém o poder do dinheiro, o capital especulativo que controla os poderes do Estado. Estes laboratórios são os grupos de mídias tradicionais, o Congresso Nacional e o Judiciário, formados por bancadas e compostos por integrantes oriúndos dos setores a serviço daquele grupo encastelado no topo da pirâmide social.

 Não há outra alternativa de cura que não seja a ruptura das macro-estruturas que sustentam a fonte de inoculação do virús do fascismo à brasileira. Os agrupamentos de forças sociais ainda organizadas e conscientes, e que atuam de forma isolada na contenção dessa enfermidade política e social,  devem ser reforçados pela união em uma frente o mais ampla possível. Sem um comando central que pense e coordene as ações de resistência, será impossível conter a destruição do que resta do Brasil como Democracia e país soberano.

 O antítodo para o fascismo tupiniquim que se alastra é a mobilização, a organização popular, é o movimento coordenado de pressão física nas ruas e praças, no Congresso, no Judiciário, no Executivo, na diplomacia externa e em todas as esferas recursais ainda possíveis. 

No primeiro momento, é preciso demarcar os campos prioritários de luta. A libertação do Lula, principal líder popular da América Latina, preso politicamente em Curitiba e o impedimento de votações das Reformas da Previdência e de autorizações de vendas de ativos da nação como campos de petróleo, empresas públicas do sistema elétrico e bancos públicos são pautas de primeira hora. 

Só o povo nas ruas garantirá a sobrevivência do Brasil inteiro. 

 

*Antonio P. Pacheco é jornalista e escritor

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